quarta-feira, 18 de novembro de 2020

na boca do estômago

 

O tempo eternizando na película do elemento
notas arrumadas de pó ao toque engavetado
no obsoletismo a necessidade de transgredirmos
emprestando-se a uma objectiva a alma
pixelizada a cicatriz parecendo curada
e vem-nos até o odor das plantas e dos passos
o bosque capturado no Outono mais esbatido
-Se pudesses ficar aqui comigo, ficarias de facto?
retido no magnético do exacto momento
esse mesmo instante preciso que não ficou
que por ali deambula incrédulo 
creio que nessas voltas ou nesses passeios exóticos
tudo o que se pode chamar de supremo sacro feliz
do ponto de vista óptico: o espanto

e porque do fingimento de que não partimos nunca
essa ópera do malandro trágico soturna 
porque afinal não habitava ninguém nessa urna
é como se sepultassemos uma campa de oxigénio
porque nas alturas tudo se propaga sem gravidade
talvez essas asas sejam de chumbo ou xisto
para nos derrubar de loucura e destroços 
lança chamas de flashes para nos ficarem os ossos 
e em nós peito e bomba de afecto 
...apenas a saudade de intelecto
como começo lento de uma bebedeira de vento
no radiador de um veículo arfante e ambulante
que não permite o movimento ao volante
-recordas-te do homem de palha que espantava medos?
ou da linha dos caminhos de ferro que ardia de espíritos
o grito no berço do animal de espinhos
e o sabor da minha boca que se dissolvia em ácidos
pois a vida é filet mignon com champagne 
e nós comemos o pão que a secura do silêncio amassou
no grande desejo que um dia possa dizê-lo: mais não
que possa sentir ter chegado ao fim da linha 
de um poema de satisfação





sexta-feira, 13 de novembro de 2020

solus peregrinus

 
Dois pés a solo na cadência frenética
de entre pisa sobe desce sufocante despe veste
o voo dos anteolhos furtado 
enganos quando nos cai o acto padecendo
e o pêlo curado e obstinado, ardendo
emparedados em beijos que porventura choram
lábios que sabem a sal e aurora sem redenção
e mais a fundo nessa atrofia de mundo
o purgatório de uma canção
na zombaria tétrica de uma vida raivosa
a folha posta para se devorarem vocábulos histamínicos
a pedra sobre pedra para se fornicarem de vazio
pingos de fogo que crescem em massa cósmica
e em tudo o que nos faz frio

pues porque es divina de noche sirve de manta
a la muerte con una sonrisa

e um tão alto o abismo
num peito curvo de fundamentalismo
foi-se essa ave perder-se

num rombo de pancada feroz teclas marteladas
ocos de bicho como porta dos fundos
no son sino corredores del dolor
de una intensa tristeza sem carne
que zomba para te aventar pelas cortinas da pele
para aterrar com almofadas de limalhas e fel
assim é tão fino e penetrante o rasgo 
na linha da noite mais finda que atravessa como garça 
o lado avesso da paisagem
algo que não possuo mais agarro enquanto mortal
como pode ser alheio este corpo a tal voo
está um homem armado sentinela de nudez
contra a vida descontente clara e evidente 
quien consiente ansí la vida consiente también la muerte
a fogo e ar que a língua custa a apagar
o poder a temperança ou a faca que custa a cortar
pela escotilha do quarto emerso apenas pontos de luz
que antes via como passagem agora secreta

assim estou espaciado
cada molécula granulado pixel amorfo
frenético frenético padecendo de objecto
o coração feito traça na linha desfeita
o entre o vago tempo que nos ocupa
para a virtude de viver sem tempo
fabril em turbinas espirálicas virais 
flutuar sem medidas gravitacionais
criar propósito agasalho para o estival da alma
que um dia o sol nasça espantoso e livre
e em palmos de matéria me perca e viva
suplicante virtuoso de mim vasto
en la tierra queda
e na terra quieta 
que la ausencia causa olvido
que a ausência seja o fluído
in vitro
invicto