domingo, 15 de maio de 2022

Exercício do porão

 

Deixa-se uma brisa tépida 
no peito desnivelado das águas do mar
a perda irreparável do que é ser onda 
do que é dissipar-se à mercê da sombra 
e de todos os ritmos cardíacos da existência 
reparaste na distância quando se ficaram tensos
os músculos do instrumento lúcido 
sobra sempre partes de detalhe fora de tempo
mossa suficiente junto à pele
para os afazeres do mundo em brasa
nalgumas estrofes o sabor ácido da página 
mórbido nas têmporas do latir da juventude 
falta a leitura do excesso em mim
a máquina do mundo engrenada na tortura
da engenharia universal da loucura
o poeta interpela a própria aura do caminho
no singular exercício do debruçar no horizonte 
em micro espirais, ordem de soltura e desmedida 
como um ponto é uma ilha, a salina poça na sedução 
e roça a crueldade sem mais revelação 
sublinho as omoplatas de um pavão 
selando o voo sem mais vacuidade
o nosso sangue é de verdade, vamos morrer
e o massacre de inocentes sedições
os homens sentiam a tempestade nos ossos
a fragilidade nas escamas e na espinha mole
o monstro dormia lhes nas entranhas
chibatas num repto de dor
querem as sereias que requiem sem má fé 
lhes dobrem a viagem de pé 
o meu olhar vacilava, vítreo 
fustigada por não dúvidas projectada
a explanação do mal em noites de convés 
notas menores, torturando almas de porão 
que se afastam das pessoas pelo odor da exaustão 
a viagem será sempre marginal
para o terrível estado de catatonia terrestre
e íntimas provocações do inferno

Mal o homem guiava o mastro
já o fim estava ao milímetro do sol
era-me fronteira já antes de nascer


era o estado mental que eu conhecia 
para sem mérito, sem redenção 
Jaz a obediência sem mais não 


Deixa ver, deixa ver!