segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

exilados da terra


um dia serei cinza e vento barítono
e do meu lar crescerão feras
e as árvores cairão sobre grandes pedras
das janelas pontas para o céu alongando-se
para que se me partam os ossos
uma ave despregada e o sol em vermelha dilatação
o animal arqueja
no último degrau depois de subido
a cratera mortal do último sopro
as vozes agudas dos pássaros gente em volta
nessa corrida contra poente
o rugido constante turbo sombrio
nenhum ser vivendo mais nas entranhas
a flauta serpente que anuncia o final do tempo
o lugar da cabeça à mesa ou um prato vazio
e o animal eriçado do azul mais duro
o palatino das estações orbitais oculares
abate-se-me como uma floresta despida
a ferida injectada de dor profunda
no zumbido das bobinas de tortura ondulada
são árvores negras
fios de seda electrificados
fitas de plumas em tubos metálicos
partem do funcionamento pantanoso dos órgãos
ao travão do impacto sectorial horizonte
capaz de gelar o sangue
um suspiro fertilizado de cólera
no equilíbrio do caos bioquímico
bonecos fleumáticos na poeira cósmica irradiar
absorvermo-nos muito depressa
o passageiro na cabine da mente
animal gentil pendente nas lajes onde cai a chuva fria
confessar-se o terror no colo prateado da lua
de tudo o que fica para além da vida
um disco rígido uma arma fina de agulhas
a chuva cristalizada vagarosamente
no limite somos sobreaquecimento
e a noite apenas o começo
acabada de cair do ventre
dos ramos dos mantos das cortiças
o ar carregado de radiações oníricas
e o estalar dos tímpanos
nas paredes montanhosas do peito
redes de aço em trapézios de beijos
uma garrafa atirada ao pavimento da alma
para o ruído revirado do silêncio
apunhalamos as sombras
os rostos magros da morte
para se rasgar o tecto e os tecidos do real
as mãos abrirem o corpo em passeio
a coagular o fosso das horas
gárgulas guardiãs das paredes do sonho
e da metamorfose do nosso amor
a cadeira baloiça desengonçada nos braços maternos
para embalar a saudade
e o chão range de chocalhos
para uivar as fronteiras
a pulvorização sulfúrica que erguemos
depois de tudo



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