O mar enrola na areia, ninguém sabe o que ele diz. E eu prometi voltar na hora em que o sol estivesse mais quente. Na hora em que o conforto me permite viajar ora no ontem, ora agora, e já era. Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...Do fado à festa, da ciência ao coração, da razão à sua ausência. Nos dois pólos a oscilação permite-me criar. E acelero e ascendo, ou directo à decadência. Umas vezes em nada e eu vegeto outras a um ritmo extenuante. Assim eu vivo. Na boleia de tudo o que existe à minha disposição, eu sinto. Não sou várias, sou uma só em muitas disposições. Também à volta assim o é, não é? Não vês?
- Sabe o que é que aconteceu ao meu vizinho? A mulher estava a levantar dinheiro no multibanco, apareceu um indivíduo que tentou assaltá-la, o meu vizinho tentou defendê-la, o indivíduo sacou de uma arma deu-lhe um tiro no peito e matou-o. O meu vizinho era missionário, distribuía a reforma dele por quem tinha mais necessidade. Foi piloto da Tap.
O que é que Deus anda a fazer? Se a morte colhe ao acaso sem critério de bem ou mal. A Teoria do Equilíbrio do Universo é curiosa. Se alguma coisa de errado acontece que prejudique alguém, noutro lugar algo de muito bom beneficia outro alguém. E não é nenhum Deus que promove este equilíbrio, é a ordem da Natureza.
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...Mas na ausência de um sentido que dê sentido aos meus sentidos, também eu preciso de filosofias. Mas a minha filosofia é primária, olho por olho, dente por dente. Animal pouco crente na ideia de dar a outra face. Dar a outra face pressupõe inactividade e fé na iluminação da culpa interior do outro. Tretas, quem não tem moral, nunca a terá. Protejam a vossa família e os vossos amigos. Protejam os vossos bens e o vosso carácter. Protecção ou justiça pelas próprias mãos? Para além de Deus, também não creio na nossa justiça. É lenta, burocrática e sobretudo pouco eficaz. Qual é o papel da justiça se não impor limites no cidadão. Ci da dão, outra expressão curiosa que me leva a mais uma descrença: a sociedade onde supostamente me deva inserir. Com impostos, com imposições, com restrições e sem nenhuma ou qualquer protecção ou garantia individual de saúde, educação e projectos de vida. É esta indignação que me faz descer à terra. É este não querer pertencer a nada disto, porque não concordo, porque não o elegi, porque não o compreendo.
Na simplicidade de um ignorante guardador de rebanhos reside por ventura a solução para as sociedades doentes deste século. No regresso à terra, à comunidade, à cooperação e reunião familiar, à produção do essencial. Quem acredita nisto, precisa de uma fé maior: a fé nos homens, na sua capacidade de fazer o bem. Mas o homem é um animal. Territorial, egocêntrico e cada vez mais, desenraizado da terra que o sustenta.
Anti-metafísico. Em última instância para quem se sente atormentado com tudo isto. Para quem se sente pequeno para agir. Quanto a mim, desejo que permaneça num dos pólos a minha filosofia animal e no outro uma força imensa que me leve a crer que aonde as minhas mãos alcancem, eu posso fazer melhor.
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