domingo, 20 de setembro de 2020

Olhos repostos em asa

 

a roda dos expostos desenjeitados

está um homem de pedra em rotação 
um homem feto  por habitação de alma
para que lhe baste um grande sonho
-anda à roda, a realidade mata quanto sobra
lágrimas de orfandade
o escuro sem cabos de trapézio elástico 
é como levantar voo no deserto
descarnado, os dedos compostos de ferro
é o cabo do mundo electrificado e pardacento
morro recortado fixo adornado de sede
e  um líquido perfurado de ramos em novelo 
a via sacra começa no momento zero
e há uma 2via na nossa vida, A2, a folha em branco 
cactos imóveis de hálito da luz
bilhas de vocábulo da fonte carregada e na mente 
a tela fresca
ofusca
gritam da carnificina os imutáveis 
nódoa de laivos
a cor da alma feroz
sobre pancadas
dentro de cavernas subabismais
os fios da areia para uma paisagem que morre 
o percurso dos cardumes incansável 
e uma barbatana à tona condensada à asfixia
talvez a armação retalhada de um bocado de terra 
Rendilhada
os cantos de uma embarcação redundante 
e avarenta de raízes 
nasce e morre pedindo por um estado sólido da alma
de respiração boca a boca líquida 
a desova lírica na cauda de uma andorinha 
sinal arrematado
a grande mutação com isco na extremidade 
quero assistir à lota tamborilosa de um negro peixe punhal
mais gordo polvo de alcofa
albatrozes de ruas tortuosas
a ira para a comoda seca ternura 
água empoçada de uma ave que  não pode  ser sua
respinga e fede
a cor avermelhada de uma colcha de pele
por milagre guarniceiro
um vasto campo funerário 
de um céu  compacto
há uma escama uma só escama
necessária para que os braços da ira
cavalgadura traineira da noite 
escama dos aparelhos da rede da Terra
e nós inesgotáveis cardumes 
matem me com dinamite 
mas nunca com um limite
os areais do peixe são a palavra
agarrem me a um cabo fixo
na baía do umbigo
porque nunca serei apenas um aparelho auditivo
Teima o sol bate em cheio
o horizonte é uma linha de trapézio 
onde como crianças baloiçamos
a luz do luar alastra
a malha encarnada no cooperativo do sono
remos para criar estruturas e pedaços de asas 
a cor do barro, ainda as espigas dunas
o arrasto da terra para criar castelos de sombra
um castelo azul revolto e verde
as águas adormecidas com a carga de uma espinha fria
viúvas recém nascidas
no lume da navalha e um pau atravessado
como quem fica de saudade
com os braços no ar
polir, desfazer se num sopro
a luz é fraca e ronda silenciosa
tal como a linha final na ponta da árvore 
uma ilha destacada para pescadores de fora
dramática edificação para zinco de jardins 
quero uns olhos repletos de ingenuidade
perigosa fome de alma tábua navalha
e os dentes todos salpicos de ondas
rasgando a carne suporte do corpo 
o instantâneo piloto cuspido de cristo
e alguns barcos passam
de águas mórbidas 
e sacode golpeando o cais
um cão de beira de cais
que veio em lágrimas 
pedir abrigo do mundo





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