domingo, 5 de dezembro de 2021

Ad astra

 

Morrer na estratosfera
desprendido da teia do tempo
diz que se trata de uma eclipsofagia
multiplicada como uma pregadeira de fios
flutuantes de despimento subversivo 
ocorreu-me a existência dos trilhos depois de borboleta
o chão que agora serve de rede ao casulo
esgotado dos cometas
sinto amargamente o peso da onda galáctica 
no fundo do útero depois de parido
enamorado dos futuros filamentos do infinito 
avistam-me do terraço flamengos
cabelos escuros de anjos mortiços
no fundo das costas terrivelmente femininos
dos sonhos meio recordados ou inacabados 
teria deixado o vinco ainda quente e húmido 
fi-lo lembrar de como a massa se deposita e depois pára 
nessa metamorfose de pássaro
o tempo medita a existência na amplitude
nómada de todos os ventos
fossem todos os olhares o perímetro 
a mão da criança penetrando o aquário 
lago de pedra e nenúfar 
quer agarrar o peixe, o sapo, a cobra, o chão 
do mundo cremado do imaginário 
Sabe que por dentro habitam ínfimos quartos
onde só cabem seres de pé emparedados
alguns aos pares outros monólogos 
depois estender-se em baloiço de camisas brancas
as cordas fitas de liga 
que a avó guardava numa arca de vidro
era difícil a respiração, sexual pubretária
batia-se nas paredes em morse
havia o odor de peixe frito e louro
ramos pregados em largas bacias parideiras
a música era o sopro dos dias conhecidos
uma casa sempre noite, e nós sempre verticalidade
- quando era criança baloiçava-me
não vais cair, o corpo agora já não tem peso
e tanto a dor não tem fim nem começo
Dormiamos de olhos abertos
assim vigas que vistas de fora 
são os ossos calibrados de nanismo
esse quadro a óleo, herdei-o
mas os cascos, deixei-os descalços 





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