sexta-feira, 13 de julho de 2018

o último voo



a trepadeira sobe pela coluna de ar quente
enrolando-se reptilmente de pescoço extensão
os braços as mãos que puxam a corda ao sol
para desaparecer por detrás dos montes de branco
no  instante seguinte o jazigo da solidão
os dias da cólera um odor desvanecido
pendular o corpo jangada sobre o mar
espasmos de luz de línguas mortas
hidra nas suas urnas suspensas de vida
as partes pesadas deixadas à terra
para o transplante cíclico dos tempos
depois invocar-se de fantasmas doidos
para o retroceder da loucura
mais a dentro mais negro mais ordália
o arrasto da distorção das cordas
para o integrar das imagens ainda vivas
um helicóptero pousado na palma da mão
o resmar do papel lençol flutuante
nas grandes trevas onde não se teme a nada
controlar a visão ondulação
os contornos insolúveis da actividade neural
os monitores acusando a geleia imersa do pensamento
a inconsciência a inconsistência
quadros de parede agora de cotão no convés
o olho imóvel de novos poderes
um tanque de nutrientes de massa e matéria e electrodos
os tecidos deteriorados dos processos passados
crianças suspensas anímicas
a zero desprovidos de engenharia planetária
e guerras marcianas de bancos de rostos
tudo terá outro nome de baptismo
antes do holocausto da contracção da dor
cabelos brancos velhos longos secos
antigas civilizações de um papel sedoso e passivo
o último suspiro magnético
para um último acto de mutação sem talismãs
depois as mesmas horas as mesmas estrelas
só o metabolismo poético empírico subterrâneo
o refúgio entre desertos de rocha e afecto
a nave um espaço interior de contemplação
original do êxodo dos primeiros poetas
à beira de um abismo vocábulo
as palavras cuspidas de torpedo e castigo
no absoluto fanatismo expiado
subi a escada de vidro de casaco completo
todo o clic ponta de fio cortina imensa
a terra num barulho irritante de encravado
o movimento parado simulando vida
assinados os contratos de apólices caducadas
lá em baixo rostos familiares presos ao chão
uma mulher grita na escuridão que fica
o grito voa e trepa pela coluna vertebral
o corpo ferve impedido de gesticular pânico
quero saltar porque não sei o que me espera
saltar de uma janela mas todas têm grades de flanela
o vazio é uma trepadeira trancada de retorno
e o corpo uma nuvem almofada adesivo mordido
os ossos despedaçando-se como folhas arrancadas
um corpo gancho que leva atrelado a uma lâmpada
o meu grito junta-se ao outro um buraco que cresce
como se fosse um pássaro morto que engoliu a língua
ou uma alma deixada ao sol em salmoura
num qualquer ponto do universo à deriva

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