Pois coração declaro-te impotente
tenho esta imagem na mente
um homem lavando-se publicamente
esfregando o sexo, lavando os sovacos, catando os piolhos, cortando os cotos,
tirando do sarro da boca
a dignidade que lhe sobra
para estar limpo para as sobras
pois coração de hiper realismo
te encontras a leste do paraíso
quando o murmúrio der lugar ao grito
que ridículo se acreditar na poesia
quando podemos quase tudo com o punho
menos lavar o sexo em público
Tenho estado com essa outra imagem
uma camarada, térmitas soviéticas
deito-me sobre a terra seca sigo-lhe a carreira
esse púlpito de arame farpado lá no alto
para ser trapézio de um mundo que há muito
se distanciou do leste sonhado
suporto melhor hoje a ideia da finitude
quando no acender das luzes
cabe também o poema concreto e subterrâneo
já velho, muito velho, como o conheci
antes de lhe acompanhar o cortejo
quanto mais depressa essa ideia se consumir
uma candeia atingida por pirilampos extintos
quanto mais longínqua a minha ideia se cobrir de escancarada e descarada
subversiva alma mergulhada
menos sentido faz o verbo e é por isso
que embora sem precisar de o explicar
como quase tudo o que chega ao seu rumo
volto vagueando, para no atravessar desse louco
poder também eu passar despercebido
No enclave da morte
para que volte, uma e outra vez
mais forte, mais vivo, mais lúcido
mais bravo
mesmo que seja para lavar
o meu sexo em público
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