estava debruçado no seu parapeito
olhos postos
no céu que espelha uma constelação mental
a perceção do espaço para lugar de batimento
partem pensamentos numa terrível confusão
a cabeça sobre a almofada de ferro insana
limitantes as paredes do mundo interno
continentes de memórias de muitas horas
tudo é tormento infundido de medo de fim
e estranhamente rico e aéreo esse estado
com cabeça de corvo e pescoço helénico
domina a língua estrangeira do alucínio
posologia para atracar muito mais longe
que poderia salva-lo senão uma ponte além céu
dos seus dedos sentido de via régia
articulados para moldar em bruto
no princípio era ardente, violento
o gesto murro tosco criando fissuras
uma liberação prazerosa de se descompor
partindo de coisa nenhuma
fascinante esse momento de nascer busto
imbuído de vida traço a traço a figura objeto
a mesma constelação que dizem ser amar
a figura tem agora os seus próprios olhos
remoinhos oculares aquosos de infante
ávidos de ecos primitivos e vibrações cruas
imploram por pálpebras como longas persianas
a figura tem fome de corpo, de lua, de boca
assim lhe molda então os dentes, presas afiadas
e uma língua bifurcada para que diga a verdade
mas um momento de afastamento lúcido se impõe
em pausa o escultor na obsessão da posse pondera
se lhe der braços sufoca, se lhe der pernas foge
se lhe der alma pensa, se lhe der coração chora
se chora...talvez morra de tristeza..
e se morre talvez se perca para sempre na névoa
talvez...fugindo nunca encontre o caminho de volta
ou sufocando-se nunca se consiga desprender
sem ser livre nunca poderá ser gente
e amar apenas um busto...crê que nunca lhe chegará
assim afasta as mãos do projeto que inacabado
agora na distância de um pensamento mais claro
poderá ser nomeado de auto retrato
há sempre um auto retrato inacabado
há sempre um busto dentro de cada homem em bruto
um sonho de amor sem um modelo concreto
ou muito concretamente impossível de modelar
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