quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

a um deus sintético




no colo da virgem sintética
o esqueleto de uma árvore decapitada
cobertos de névoa os campos são florescência
gotas que pendem para cristalizar a dor
no ventre da terra ancoradas as cordas
do instrumento que nos distorce
o cordeiro aninhado em espinhos sonha
o manto de todas as mães dos nossos terrores
sem tocar deixamos lençóis engomados
instantes em que nos despimos e vestimos
intervalos de inexistência
pasta o rebanho nesse retrato a preto e branco
ancorar na omoplata direita que sofre
o instrumento doentio não mais melódico
a linha que estica e encolhe por asfixia 
do fole o fluxo vascular para a secura
talvez uma chuva que nos leva por arrasto
a luz raiando a miopia natural
demasiado oxigénio a rasgar no lugar
as asas que partiram antes do corpo doer
disparos de cegueira para a paz da fé
e os momentos caem ao encontro do adeus
volteio nesse perímetro de recantos e colunas
que atrapalham as voltas da lucidez
guardar na carteira o santo pisar o chão colante
cuspir o atraso das horas que nos partem
em impossibilidade de construir a carne
mas as mãos voltam ao bolso e descobrem
a solidão da virgem de cartão
e do outro lado da rua saindo de casa
alguém carrega uma árvore nua decapitada


Sem comentários:

Enviar um comentário