sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

auroras de luz



golpes de luz iludindo as arestas
para nos partirmos em instantes
para o terror da madrugada lúcida
foi o vogar lento de um passeio
o lugar comum purificando a dor
assento aurora na fronteira de um rio
encosto as vértebras à corrente
desdobrar-me e assumir o fluxo da água
negro o rio devora-nos lento
aspiro a náusea flores de dentro da cabeça
o frio de um intervalo que se quer despido
ficar-se por ali a contemplar a mistura escamosa
o arrasto viscoso da língua que mergulha noutra língua
sentir o arrepio da espinha quando arrancado à linha
e atirado de novo à água já morto mas ainda vibrando
para ser desconectado da parede das estrelas
ou emprestar-se a toda a pele que se funde no balaço
doce e amargo da nascente ao inferno
sopram preces de um prazer tão íntimo
que só o silêncio respirado é capaz
e corpos abandonados capazes
essa massa brutal corpo de água um só ser
longe de pensar onde acabar o movimento prende-se
nas docas entre as pernas que caminham arrumadas
sobre a água, dentro de água, fora de água
a luz abrindo portais de longe
rasgando a pele que vira costas e atira-se à margem
para nos partirmos em instantes equidistantes
nesse arrasto melódico, o rio
um organista do mundo dos vivos
que por nós há-de passar


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