segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
sempre soube que por lá fiquei
cidades do interior como as amo
florestas submersas numa atmosfera de espera
os pés caminham lentamente por quelhos
onde nenhum pulsante mecanizado pousou
onde ainda quem chora com música
com as notas que pendem da luz conhecida
há uma paz encontrada nas rotinas
nas horas diurnas nos raios de sol e chuva
o olhar pode, estender-se por cumes e longes
em cadeia tudo movimento contínuo
havendo uma completa dissolução
da captura do amor único
tambores fervendo na companhia de uma vida
os olhos dos outros são aqui mergulhadores
qualquer coisa que se vai criando livremente
nas beiras do rio, às ombreiras das portas
quebram-se os moldes da sedução
quando aqueles que partem para a civilização
não voltam
a cidade não importa, é um sonho torto
de quem não conhece o compromisso da terra
que herdou tal como um nome
e o regaço inclinado da idade
o negro que cobre a jovialidade
pelo odor dos trapézios das copas
o bosque da saudade
revela-se o estar completamente só
como só a noite e o sonho de cada um
espaços entre retratos e quadros
pedaços de cal como os ossos para a carne
ás vezes penso que nasci ao contrário
que a minha vontade de contemplar é maior
que pudesse já terminada esta canseira de luta
e que num banco de pedra junto a uma laranjeira
tudo fosse sombra de uma vida inteira
não seria precisa uma sombra muito extensa
e se não fossem as dores para a cova
nenhuma outra idade seria tão atraente
das substâncias do passado a alma quieta
que pode haver para mais tarde senão ontem?
as aparências da ausência de mais querer
ou as forças que se encontram em dormência
mas das linhas luxuriantes do tempo
há o violento desejo de se rasgar o céu
o pensamento em caleidoscópio, daqui
que sei eu?
fixar a coloração e os deveres da morgue
para o mundo não despertarei amanhã
mas ele continua lá
invejo a simplicidade
da partida de quem morre de verdade
de quem parte satisfeito com a vida
acredito
que parte de nós é milagre
acredito
na face narcótica do paraíso
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