sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Hibernáculo



o transpor das montanhas
passos de guerra e paz
um código único escrito no interior de cada tronco
fusão
o evitar da escoriação
Constantinopla
impérios de antiguidade
homens cobertos de autoridade
alumiar
a podridão chegando ao âmago
o reter dos despenhados
a descarga de uma só passagem
rota à última vontade
usurpação da verdade

e da claridade matutina o espelho
a arte criminosa do espírito mau
esse espírito obrigado, enrodilhado, entregue
ao espelho, género nado morto
anjo tutelar do desalento
desse mundo amplo que não sai do corpo
ao pai comum de todos os comuns mortais
me ajoelho

e lágrimas alheias, deixo
ao calvário agoniado espírito de sangue
tão despida a vida de recompensa
que só o sonho extraordinário
às portas do templo, esse clarão matutino
com quem me entendo

estar vivo dá que fazer
é preciso abandonar o espelho e espelhar vida
na linguagem dos homens
no amor sincero
na terra colhida de gratidão
com a mão firmada na poesia
profetizando para multidões de criaturas sem reflexo
ainda.

pergaminho de fel
o segredo das inspirações
de curta devoração
a mão que recebe sucessivamente a chaga

o martírio de uma alma repelida
em transe consciente transeunte pela vida
que adormece num túmulo de silêncio
e acorda aos pés do precipício terreno
o fazer das pazes com o espírito vestigial

porque o verbo é um acto de rugir silencioso
nação sepulcra de indecisas golfadas
numa fortaleza de recordações
que se espreguiçam no aposento de trovas arqueadas

ri e chora
o homem-criança que se despede cadáver
haverá paz depois de tudo?
a braço de ferro contra a terrível foice da morte
esquadrões de gritos das estrelas relâmpagos
para um novo romper da alvorada
no batimento cardíaco de uma criança

mas o céu reservado ao desbarato
um coro de finados desafinados
em toda a blasfémia de se crer
nas expressões sublimes do verbo
quando ele ainda conjugava o caos
a ave e o verme
passageiros incertos ne leme da poesia

e que voltas abolição rebolição
no fundo dos vales, raízes carcomidas
raios de sombras pendidas
: o contentamento do momento
a hora absoluta e tétrica
os campos andam cadavéricos
devolutos de mão fértil
esse o acordar fel do poeta
o horror de uma luta entregue
o espírito atira-se
das torres centenárias da memória
uma luta inglória
para uma queda nunca perfeita
ao melancólico viver de outrora
enquanto tudo não passar de cinzas
a recusa do vencido
esse género de tirania
que é o espírito encurralado
o punhal do inimigo é um espírito quebrado
nele vive e respira
a morte bárbara da vida

ao crepúsculo magnético: a energia
musgos de electricidade epidérmica
o solo não se comprime, compartimenta
as águas do céu não se choram, alimentam
a robustez da alma alevantando-se
searas maduras ao arrebatimento
fincar os pés para colidir a tempo
movimento maquinal anti-envelhecimento
raízes torcidas como membros doridos
aspirar revoltosamente o ar
a derradeira prova de respirar
e sermos multiplicação de caminho
nos dias seculares de não atravessar
a fustigar pálidos cabeços

como nus esqueletos de gargantas e vales
uma fera-fantasma caudal
espaços distorcidos de veios combativos
onde jaziam ao chão, pêndulos caídos
que haviam sido proféticos

o sangue, a pele, a hora apetecida de cair
nesse espaço que não se encolhe, não se escolhe
da vontade estacional da alma pura e mistério
do repousar eterno
ali, o precipício é um caos nascido
iniciático
de claridade e noite, da convulsão do fantástico

em catadupa a solidão fugitiva
as gradações das sombras dos homens
o próprio crer e largar das rédeas
galgam por cima as estrelas também elas
conspirações de promessas vivas

expira sem combate
picos agudos de hemorragias líricas
tanto a fuga como a perseguição, são em vão
os píncaros dos montes de perenes folhagens
nodosas, alvas, as nuvens são escalas
de criar a grande distância
num quase imperdoável sussurro
voam despidos os absurdos

rochedos esculpidos
entidades íntimas de inversão
e poder imita-los de braços estendidos
e o tropear confuso do vento
e o tilintar de portas giratórias
onde habitam criaturas sedentas
entre nós e a assombração
retardando-se a si próprio
o gemido filho de vultos
debaixo dos nós pés
condutas do pensamento
a erguer da cova a quietação amorfa
todos somos estátuas das circunstâncias, escravas

livrai-nos das palavras que nos guiam
em torno de um eixo sem retorno
aventai a vista ao abismo
e olhai para além do submerso
donde se alumiou
o primeiro raio de nascimento
-somos perseguidos. semimortos escritos
tropeados em espirais sem capítulos
-se já o virar da página...

espalmado sobre o tecto um passageiro
incrédulo
algumas palavras são súplicas
púlpitos inarticulados de loucura
outras pontas de punhais
de brandura e energia nazarena
há as solidões, robustas, proféticas
tudo se encantando na cabeça
e viesse arrancar-me do cativeiro
várias de um lado para o outro
para o alojamento junto ao peito

a ponte estreita
sujeitar à lei do poeta
brutalmente volvido ao poema
do semiselvagem nascimento
desenfreado

são enfim interruptores mortiços
restos de iguarias antigas
esforçado pouco filho de musa

as disputas ardentes
que correm de mão em mão
a submissão
o esforço brutal para a afronta mortal
se multiplicar de sangue
-resigna-te ou confia
o cometa segue a sua órbita
e o seio insano de deus, a palavra
teremos dormido na última ceia?
o silêncio é ansioso
querendo deixar cair à terra e não conseguir
a férrea cadeia do nosso obedecer
a uma lei que nos é estranha
uns valemos mais que outros?
nenhum de nós voltará
não há mundo outro
se podeis contar as estrelas que habitam o céu
são essas que lá estão
nos transpomos dos passos que nos levam
o único facho que alumia os olhos altivos
pelas choupanas dos corredores sombrios
vossa filha, vossa, mãe, vossa irmã
já partiu
e olhar ainda o dia que vem do vazio
como uma criança tímida
o conhecer dos cantos à cripta fundamental
pelas cinzas desse coração ainda virgem
deixar-se salvar do martírio de caminhar
através das grades, lutar, as suas armas, suspensas
e derrama-las, de rama insana, ama-las














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