Vem comigo. Faz a tua mala e parte comigo. Aqui as luzes da cidade deixaram de brilhar. Eu quero ir contigo. Mesmo que nada disto faça sentido. Enquanto escrevo na minha sala sozinha e a cadela dorme à minha beira, o tempo encosta-se na linha. Espero. Não tenho muita paciência para esperar mas espero. E enquanto espero escrevo. Escrevo para que o tempo passe depressa e tu decidas partir.
E o comboio corre. Para trás fica uma paisagem de desespero. Árida como planície alentejana. O futuro não importa porque não existe. Aqui e agora, é tudo o que temos. Os sonhos caíram na derrota. Uma luta que foi perdida à nascença. Viajantes, é tudo o que podemos ser.
Não sejas um estranho para mim. Quando nos embalamos no silêncio escuto o teu coração. Ao contrário das tuas palavras, os teus olhos chamam pelos meus. Ligação humana, é só o que te peço nesta tarde de chuva. Há muito tempo que chove aqui. Mas nós temos tempo, quando não existe futuro, temos todo o tempo do mundo para nos embalarmos. Não partas, se queres saber o que penso. Anda, faz a tua mala e parte comigo. Não penses mais nisso. Para trás fica tudo o que não foi possível. Mesmo sem sonhos, podemos viajar dentro de nós.
E o comboio pára. Saí sozinha na estação. Eu e as minhas palavras. Saí pesada, carregada de mim mesma. Corro sem olhar para trás. Corro tão depressa que vou perdendo tudo o que trago..roupas, dinheiro..livros..identidade..sou só corpo em movimento..correndo. E também a minha mente se vai despindo...de tudo..livremente vazia. Corro até cair de cansaço e adormeço. Em qualquer canto do mundo, durmo. Livre, como criança no ventre. À espera, de renascer.
Por isso, peco-te uma última vez, vem comigo. Na próxima estação, o comboio espera por nós dois.
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