quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Diz à mãe



tudo isso para chegares ao topo da torre
e do topo da torre te atirares em voo
que sem asas ou engenharia mecânica
o teu voo é apenas uma chegada rápida
aos pés da terra árida donde foste parido
é tudo tão cíclico...é tudo tão pérfido
ao colo do barco encalhado, vai e vem
o olhar do homem de mar traiçoeiro
como pronunciar de sedução ruína
essa trepadeira de ideias sem beira
gaivotas estampidas em pedra
das mãos-rochas escorre a areia murcha
uma algibeira de concha aleatória aberta
auréola de azinhagas por onde silêncios
seguem as pegadas das aves que hibernam
e das amígdalas se aventam palavras
em dialectos de bruxas, sussurros aflitos
naquele triângulo de mapa desaparecido.
-Diz à mãe que eu parti assim que nasci.
Não bibelô ou napron, ou chorão refilão
mas no ralo do tanque, toda essa branquidão.
fui como lata de biscoitos assaltada
riscos de lápis em cadernos molhados
é que eu era a única vela da casa assombrada
e dela as letras não se me aprendiam nada.
-Diz à mãe que eu sinto-lhe falta de mim.
da significância de uma caneca
na especulância de me entornar mundo fora
no instante em que abri a porta
no pedal da máquina de costura
o pé ser serradura, o pano ser pestana e pálpebra
mas a maçaneta ardia-me nas palmas
de lugar continuado o poço ser gotas
de boina francesa e meias brancas de renda
o gesso da canela autografado por vedetas
tenho tanta febre que o colchão se multiplica
e lá em baixo, sempre, a tal ervilha




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