terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O poema bloqueado




cintilam os ornatos dos sucessos
no espelho um pente que se escorre
pelos compridos cabelos da neurose
os móveis sentam-me penetrado
no empedrado do que foi já conquistado
Senhor! Se nem bem estava em mim
não me recordo sequer do momento
em que da minha boca saiu ondulação
e que agora como que sem refrão
dentro de mim, escuto soltas as rimas
incapazes de se arrumarem na linha
tão bela a feição divina, mas breve
porque há que continuar em frente
e no superar, e melhorar e vencer
o primeiro pior dos entraves
tu mesmo! a porta foi aberta
não por desmazelo ou assalto
mas porque o tesouro que se guarda
não tem mapa, tem deixar-se ir
tem fé porque a doutrina vem de pé
a grande marcha é cega
porque é pelo sentir que se apalpa
e a cada nova palma, uma salva
não de prata, não de platina,
uma salva-vida!
Mas nada disto me serve o propósito
do momento presente,
o que quero é declamar completamente
e enumerar todas as palavras que oficiais
sejam capazes de chegar às finais.
E ás vezes na pressão ou na pressa
o bloqueio se instala
e é preciso uma pausa
e voltar ao início, voltar a percorrer o caminho
não em pessoa, mas no rápido documentário
que já foi explicado e resumido pelo narrador
que temos dentro do próprio actor
E a dor, sim, é árduo o percurso do exigente
nada lhe chega, nada é suficiente
e depois se apaga e se volta ao início
e depois de muita volta, nada.
E é aí que se sai de casa, que se passeia.
Que se afasta o que nos bloqueia.
E é nessa distância que se consegue
esse dito domínio sobre o que se escreve.
Ou não. Ou insistir-se até quebrar as lianas
e todas as teias de aranha,
insistir até a raiva surgir, no ponto certo
de dizer: eu daqui não saio enquanto
de mim não sair o poema perfeito!











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