sexta-feira, 24 de abril de 2015

é uma questão de estar a olhar



a magnífica linha que sustém a respiração
no esplendor das silhuetas nítidas ainda
porque o dia ao lusco fusco se vai
de planos achatados que se alongam nos telhados
onde ainda um gato mia
rectângulos imperfeitos descrevem o céu
aguçados como aguarela de agulha
o picotado na esponja
minaretes de branco captura
talvez uma galáxia mais próxima
e adiante incandescências começando a exibição
lamela após lamela
só de olhar para o sol que se deita
nos deixa um nó na garganta
mais um dia que nos afasta do início
raros e preciosos meios que perdemos
que fitamos com admiração no adeus
retendo-se a respiração na magnífica linha
e nós, afinal, ainda silhuetas nítidas

retendo-se a respiração
por detrás dos edifícios que estão
a cidade que nos serve de papel de parede
e esta obra imaginária

e em geometria universal
as águas já escuras sem sóis
de um brilho quase humano
do despertador que enfim nos toca
no rasgante passar de um peixe
ainda às apalpadelas sobre o coração da terra
e de repente é noite
sem darmos por ela

o céu agora um relicário rosário
mergulhado no silêncio que trago
onde murmúrios instantes astrais
de um guarda jóias duro
reparo
no topo iluminado um pedaço que falta
do restauro dos sonhos
tudo podia ser diamantes
e nós sempre em bruto
ao querermos trepar por Babel
sem pára raios
as nuvens que escondem as estrelas
podiam ser de confiança mas não
por elas, curvas voluptuosas
de mortes femininas
a cada nova badalada homicída

e há um fosso céu que gira
um automático respirador
que nos ensina
um mapa de zelador
no ritual de se ser colector das horas
que os outros entregam à cama
no rigor mortis do dormir acordado

é uma questão de estar a olhar
para o nosso passado
como se o tivéssemos acabado
de começar


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