terça-feira, 12 de maio de 2015

try to walk in my shoes


queriam que se descalçasse
como se o chão fosse uma mesquita
e os pés se varressem por acaso
mas quantos já calçaram os seus sapatos?
tendo calos verdadeiramente satânicos
e joanetes lhe moldando as formas
e enrugados porque usados esses sapatos
são como um vagão de paisagem batida
vagão do que foi viajar em primeira vida
são hoje um quadro monótono
com buracos por onde a chuva
às vezes é incómoda
e aldeias enterradas nas solas já gastas
amplos armazéns de micoses coçantes
riachos de suor de caminhadas teimosas
o brilho sinuoso à muito que é oásis
e aventurar-se de novo, talvez fosse impossível
que uma vez se descolando na frente
atrás fosse o óbvio
mas não tendo outros, esses sapatos solidão
querem ainda anunciar que carregam
pés de carne e osso
pés que vibram com o frio ou o calor
pés que dormem calçados no passeio
e bem atados ao tornozelo,
querem anunciar mas não falam

como se o chão fosse lençol de pedra
e por respeito, há que tirar os sapatos
como se o chão fosse mesquita
e os pés se varressem por sina
quando deus afinal está lá dentro
esse templo onde ninguém
pode entrar calçado
mas faz frio,
se faz faz frio no inverno não temperado
e que pode ele fazer senão dormir calçado?




Sem comentários:

Enviar um comentário